01 junho 2005

o rochedo

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nunca perdeu a vontade de trepar, escalar o que houvesse de obstáculo terroso pelo caminho. os joelhos esfolados mantiveram-se até tarde no tempo. quando podia deixava-se escorregar na descida.

nas descidas mais íngremes aprendeu a não olhar para baixo. serviu-lhe mais tarde para a vida. olhar para o fundo pode dar vertigem ou atracção do abismo. e isso ela não quer sentir.

mas a mais difícil escalada foi o colo do avô.

estranham? ela também estranhou, mas só de início. já em muito menina lhe diziam as primas:

- deixa o avô. ele não tem paciência...

- quem és tu? ah, és a filha da bia! és magrinha. parece que não bebes caldo quente.

tirava a mão de cima dos cabelos loiros da neta e voltava ao que fazia antes dessa atenção.

ela não se habituara muito a colos nem gostava que a agarrassem. por dentro agradecia. mas à noite, ouvia o pai e o avô falarem de histórias que a encantavam e mal compreendia.

o avô e o pai, juntos, riam.

era um rochedo que um dia ela tinha de escalar. mais até por ser um desafio.

o avô estivera na guerra de espanha. diziam que depois disso se tornara duro.

de uma vez, sem mais aquelas, ao seu jeito, estando o avô sentado numa cadeira alta, sozinho frente ao fogo, ela passou-lhe uma perna esguia por cima do joelho e sentou-se.

desta vez foi a neta a por-lhe uma mão nos cabelos.

- avô conte aquelas histórias da guerra que contava ao meu pai.

- quais histórias? eu sei lá histórias!

- conte as verdadeiras. as que eu gosto.

- já não me lembro...

- lembra pois!

- o raio da rapariga do que se havia de lembrar!

só se for daquela vez em que à noite assaltámos a trincheira dos outros a roubar pão e chouriços ao inimigo que a fominha era de rapar...

- sim avô, conte conte!

tinha escalado o último rochedo.

quando as mulheres voltaram da rua espantaram-se com o quadro inédito na casa, o avô com uma neta espigadota ao colo contando entusiasmado, histórias que um dia ela tentará contar.

- agora salta lá para o chão que já estás grande para colos!

- sim avô.

8 passos

Blogger Papo-seco andou...

Gosto muito da maneira como escreves e dos assuntos que escolhes.

Adorei este texto especialmente porque me revejo um pouco nele.

Desculpa a pergunta, mas, qual é o dia do teu aniversário?

:)

quarta jun. 01, 11:27:00 da manhã  
Blogger Madalena andou...

Olá papo-seco!

:)

não há pq pedir desculpa é 9 de novembro.

Bj.

quarta jun. 01, 11:43:00 da manhã  
Blogger José Alexandre Ramos andou...

:)

quarta jun. 01, 12:22:00 da tarde  
Blogger wind andou...

:) que boa escalada, linda:) beijos

quarta jun. 01, 01:08:00 da tarde  
Blogger peciscas andou...

Bela história. Original, bem escrita, sentida.
Muito bem!

quarta jun. 01, 05:10:00 da tarde  
Blogger VdeAlmeida andou...

E pela tua mão, recordei o meu avô :-) Obrigado
Beijos

quarta jun. 01, 05:43:00 da tarde  
Blogger Papo-seco andou...

Obrigado

:)

quarta jun. 01, 10:18:00 da tarde  
Blogger aDesenhar andou...

sinceramente
com a lágrina no canto do olho
recordei o meu querido avô...

fui neto, um dia serei avô
e gostava de ser também mais um rochedo...

:-)

bigado

quinta jun. 02, 01:10:00 da manhã  

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