19 maio 2005

no tempo em que a solidão não tinha nome

surgiu a caixa mágica que, no portugal do tempo, só lenta lentamente trouxe para mais perto o mundo: a televisão.

o pai não foi o primeiro a comprar. só no ano seguinte. sobravam então para a ver, os chamados cafés. pequenas tabernas onde deixara de se vender carvão e tinham agora duas mesas para as senhoras. os homens preferiam os copos e conversas ao balcão.

em frente à casa dela havia um. a dona era a mãe da melhor amiga desse tempo.

- mãe, pode dar-me o meu dinheiro hoje?

- porque é que não o guardas? em que é que o vais gastar? em pastilhas, já sei...

era o costume. ela sabia sempre tudo por antecipação, normalmente, errava. mas, nesse tempo, não se discutia com os pais. esperava-se.

- mãe...

- o que é?! - já irritado o tom.

- dá?...é para ir ao café.

- só lá há homens.

- vou ver o programa de poesia.

- se a poesia fosse uma árvore de dinheiro esta casa era rica.

- não vou sem consumir...

- toma lá e cala-te! que inferno!

dez tostões. o preço exacto de um bolo recheado com nata. não era gulosa. hoje ainda não é. era para o consumo. para poder sentar-se.


João Villaret


no café, o João Villaret ensinou-lhe o que da arte de dizer o pai não saberia. encantava-se. fixos os olhos naquele homem gordo de voz mansa e modulada de onde a arte jorrava.

o barulho. muito alto falam as pessoas em portugal!

- fazem favor de se calar!

os homens ouviram a voz que parecia vir de um escaler com apito de vapor e olharam.

era a lena.

- eu também sou cliente e quero ouvir o Villaret.

estranhamente foi-se fazendo quase total silêncio.



desde aí, naquele dia , áquela certa hora, os homens poisavam os copos e ouviam poesia.

silenciosamente.

11 passos

Blogger batista filho andou...

Hora de silenciar, ler, sentir...
(Psiu, pensamentos!)

quinta mai. 19, 01:02:00 da tarde  
Blogger TCA andou...

shiu.... a cultura tb pode ser popular. ou digam lá se pode ou não falar-se o fado.

quinta mai. 19, 02:07:00 da tarde  
Blogger Papo-seco andou...

Tenho nos ouvidos (rigorosamente verdade) o João Villaret no S. Luis.

:)

quinta mai. 19, 04:30:00 da tarde  
Blogger Madalena andou...

Acredito piamente.

Era único.

Daí que à época foi difícil, aos declamadores não caírem na tentativa de imitação.

:)

quinta mai. 19, 04:32:00 da tarde  
Blogger wind andou...

Ele era único! beijos

quinta mai. 19, 07:10:00 da tarde  
Blogger José Alexandre Ramos andou...

ah miuda valente! ah poesia que fazes calar os homens!

quinta mai. 19, 10:00:00 da tarde  
Blogger Madalena andou...

:)

dantes fazia. será que ainda?

sexta mai. 20, 09:40:00 da manhã  
Blogger VdeAlmeida andou...

Também ainda o ouvi muita vez :-) Beijos

sexta mai. 20, 10:42:00 da manhã  
Blogger Madalena andou...

Julgava-te mais novinho, Bird. Não terá sido em disco?

;)

Bjinho.

sexta mai. 20, 10:45:00 da manhã  
Blogger José Alexandre Ramos andou...

oxalá que ainda. eu calo-me.

sexta mai. 20, 03:02:00 da tarde  
Blogger Non andou...

eu insisto em dizê-la. vício meu...

:)

sexta mai. 20, 04:39:00 da tarde  

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