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de qualquer troço de quintal o pai fazia horta. não só para se comer, porque gostava da terra. aliviava-o do trabalho fechado.
numa das casas os quintais davam uns para os outros. o poço era comum. assim regavam. ela não, que não sabia ainda virar o balde lá no fundo, diziam.
- olha, filha, se queres mesmo ajudar o pai, mata os ovos que encontrares debaixo das folhas das couves.
- para quê pai?
- nascem lagartas e comem tudo.
- as lagartas pôem ovos?
- não. são as borboletas.
- não mato borboletas. são bonitas.
- está bem, são só os ovos das lagartas.
- posso arrancar uma cenoura?
- podes. lava-a da terra. estão tenrinhas agora e fazem os olhos bonitos. mas isso tu já tens.
era assim o pai. sorridente. carinhoso. paciente com ela.
- andas na horta com o fio? ainda o perdes.
a mãe.
ela não gostava do fio por causa disso. alguém lho tinha dado e era de ouro. desde aí não tivera descanso:
- olha o fio! ainda o prendes nas árvores e lá se vai...
mete o fio para dentro da blusa, ainda te o roubam.
farta, um dia tirou-o e decidiu livrar-se do calvário do ouro.
ao almoço alguém deu pela falta.
- perdeste o fio lena?
- não.
não mentia. não gostava.
- então onde é que está?
- não me lembro.
- ela sabe bem o que lhe fez!
- calma, a gente encontra-o.
depois de almoço reviraram a casa.
- está aqui, lena?
- não. aí não está.
depois foi o quintal virado do avesso.
cada alface, tomateiro, feijão verde era visto da folha à raiz.
- aí também não está.
dizia acompanhando os passos dos adultos. os vizinhos, dois deles, faziam parte já da busca ao ouro. entreajudas antigas.
até que o pai se lembrou do poço.
- e aqui, filha, estará aqui, sabes?
- corou.
- deitaste-o ao poço?
silenciou.
- bem, lá vamos ter de o despejar...
não sabia ela que se podia despejar um poço.
mas também não a obrigaram a usar ouro por muitos anos e bons.
5 passos
As mãos, a terra: limpar, revolver, semear, adubar, regar (periodicamente) , limpar (várias vezes), esperar... ver... germinar, crescer, madurar, colher... quantos verbos que as mãos amanham...
A terra, as mãos – relação estreita -, que aos poucos, com o deslocamento dos homens para as cidades, vai se desfazendo, como areia muito fina, que escapa por entre os dedos... e o vento espalha.
“Aí não está...”. Está, sim, Madalena: um retrato d’um momento, onde mais uma vez, elas, as mãos, desempenham um papel fantástico – escrever o que lhe vai pela alma!
Parabéns. Um abraço fraterno.
Muito obrigada pelo Teu texto! :)
Terra abençoada!
Abraço!
é uma ternura!
Que lindinho:) Ternurento.) beijos
Raio do oiro que te impedia de brincar à vontade! No meu caso era um relógio, que acabou partido e substituido por um xónix à prova de água e que não levava consigo a etiqueta cuidado! Dava para o rio, para a horta, para a escola e para todo o lado!
A minha horta é que nunca tinha cenouras tão bonitas como as da tua fotografia, eram sempre pequenas e tortas( mas muito saborosas).
Agora nem relógio tenho e o que mais gosto de comer são frutos directamente das árvores :)
Beijos do campo
André
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