27 julho 2005

estrada irreal


photo by matthew vinci



era quase noite. era ainda dia. vinha a escuridão da estrada vazia.

a menina andava com passos pequenos quase que corria.

- anda Lena, vamos que se acaba o dia.

- ainda falta muito?

ninguém respondia.

ao lado da mãe, não seria medo bem o que sentia, era já cansaço.

- mãe, leve-me ao colo!

a mãe não podia que levava as compras que sempre fazia na vila de sintra perto onde vivia.

mas o perto é longe quando se é pequeno e as pernas tão magras e os braços também. bem que ela os batia como asas ao vento procurando impulsos que a livrassem rápido daquela agonia.

era quase noite. era ainda dia.

só temia o longe do negro que via na estrada vazia.

- mãe, leve-me ao colo!

- não vês que não posso?

ela bem que via. no primeiro troço ainda a levara à ilharga, a mãe, mas era o carrego mais do que devia.

- tenta andar, filha.

porque iam a pé? camioneta havia, mas fora de tempo, já fora do dia. perdida que fora a dentro da hora, não podiam já esperar pela outra que atrás viria. era muito à noite quase ao novo dia...

- se o teu pai tem vindo...

o pai não viria. trabalhava tanto por tudo o que queria, que era dar às filhas o melhor que havia.

olhava o caminho, tão longo parecia. estrada infinita negrinha negrinha. o alcatrão quente quase derretia que o verão era forte. pesavam-lhe os pés o corpo doía.

súbito parou.

- não posso mais, mãe!

o rio de lágrimas molhava-lhe o peito da cara escorria.

- dói-me os calcanhares dos braços, não posso!

o ranho caía.

- não abanes tanto as mãos, não sabes andar?

era dura a voz era dura a mãe era a vida dura e ela não sabia.

só sabia o negro da infinita estrada. irreal ao vê-la.

- não posso mais, mãe...

e a mãe carregou mais aquele fardo. pequeno talvez mas era já mais do que a mãe podia.

era quase noite. era ainda dia.

ela adormeceu e de mais não lembra . como o lembraria se chegada a casa ainda dormia?

25 julho 2005

regresso


Rafael journeys underwater


regresso. nem triste nem alegre, ainda com medo de perder a paz que permitiu que espelhasse nas águas um sorriso e apoiasse nas nuvens o cérebro cansado.

passo a passo regresso a uma rotina nunca amada por não ser a escolhida.

quem me fez actriz não me fez o favor de me permitir continuar a sê-lo.

assim vivo entre o sonho do que sonho e a realidade que me parece sonhada em noite de menos abundância de alegrias.

não me queixo. não devo.

olho à minha volta e vejo os outros. se isso não me consola adverte: pára, escuta, olha!

e páro e escuto e olho. assim é fácil agradecer o que se tem.

cá vou agradecendo. vou sorrindo.

passo a dizer bom dia a toda a gente que trabalha ou descansa ou está desempregada.

tudo é transitório na vida. absolutamente tudo!

que os a quem mais a vida dói neste momento, nos olhem como gente que lhes abre o sorriso de uma manhã azul como a que eu vi a caminho do trabalho, manhã ainda fresca...

urge aprender a ser papoila, mesmo que seja flor breve, em tempo de aridez.

apetece dizer: bom dia meu Portugal magoado!

mesmo sabendo que Portugal não passa por aqui.




22 julho 2005

canção dum velho no fim.

















não hão-de haver mais histórias de Alentejo para contar

estou cansado doem-me os olhos de tanto fumo apanhar

já tenho as pernas doridas de caminhar sem destino

olhando pra lá dos montes como um pobre já sem tino.


que quer ver o que na vida ninguém lhe há-de devolver

pois o Alentejo doirado não sou eu que o volto a ver.

foram-se o trigo e o joio tudo na mesma fornada.

o que levo desta vida é a minha terra queimada!


não me mato que não sou homem dessas cobardias.

volto para onde Deus queira que se acabem os meus dias

ou na soleira da porta, como surdo mudo cego


ou na berma duma estrada olhando o longe, o desterro

que é hoje a terra vermelha cheia de pão para dar

- seca, morta, ó minha terra, aonde quero acabar!



14 julho 2005

POR FAVOR VÃO LÁ E ASSINEM!


Petição Contra a Extincão do Ballet Gulbenkian






sem Arte vivemos outra espécie de fome.

10 julho 2005

deixo um pé de flores



para quem amanhã tem de ir trabalhar.

02 julho 2005

Saiam da praia e da INDIFERENÇA:



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A fome é uma VERGONHA!