os que não eram ricos, nesse tempo.
não tinha prendas boas de brincar pelo natal: meinhas brancas, às vezes uns sapatos e um pai- natal de chocolate.
tinha sempre um presépio replecto de amor e imaginação, que o pai fazia.
com a laranja ao jantar a dividir por quatro, lidava ela bem. por ela nem comia. e eram coisas dentro a portas fechadas . mas o natal...
havia o dia seguinte. as raparigas, as outras. filhas do merceeiro ou do médico tinham brinquedos para mostrar. ela, as meias branquinhas...
"que é que o menino jesus te deu? olha a minha boneca: fala. diz mamã e papá!"
"não foi o menino jesus foi o teu pai que comprou." ela espreitara o dela toda a noite na esperança de um brinquedo.
"e a ti? que é que te deram?"
mostrava o chocolate que guardara para a hora, as meias que não calçara para poder brincar sem as sujar, os sapatos (quando havia).
"só isso?"
"não. também recebi um relógio de ouro."
"onde é que está? mostra. mostra."
"está em casa. guardou-o a minha mãe para não o roubarem."
"quem é que to deu?"
" a minha madrinha fada!"
"não há madrinhas fadas."
"eu tenho uma!"
e tinha. ela nunca mentia. sabia bem do que falava.
quando ia à tarde esperar o pai, pulidor de mármore, pelo caminho pareciam brotar do chão uns lírios pequeninos amarelos. apanhava-os.
voltava de mão dada com o pai. feliz naquela hora.
até a chamarem para jantar destribuia as flores que a madrinha fada lhe dera.
por isso acreditavam.
"as crianças não mentem", tenho ouvido ultimamente muito.
ela só mentia pelo natal.
era pobre e não gostava nada disso. no natal. já disse: só no natal!
têm alguma coisa a censurar?